sexta-feira, 3 de outubro de 2008

"Os Grandes Paradigmas da Filosofia e questões da Modernidade, Pós-Modernidade e Transmodernidade"

Integrante de grupo de Pesquisa do Mestrado do UNICURITIBA participa do curso "Os Grandes Paradigmas da Filosofia e questões da Modernidade, Pós-Modernidade e Transmodernidade" da UFPR

Nos dias 23 e 24/06/2008, em quatro encontros das 09h30 às 11h00 e das 19h00 às 20h30, na Sala de vídeo-conferência da Pós-Graduação da Faculdade de Direito da UFPR (3° andar), Eduardo Emanoel Dall’Agnol de Souza, integrante do Grupo de Pesquisa “Efetividade dos preceitos constitucionais sobre desenvolvimento sustentável e responsabilidade social ambiental: quo vadis, empresa brasileira?”, do Mestrado em Direito do UNICURITIBA, participou do curso de Filosofia "Os Grandes Paradigmas da Filosofia e questões da Modernidade, Pós-Modernidade e Transmodernidade".

O evento foi promovido pelo Centro Acadêmico Hugo Simas, integrando a Semana de Férias do CAHS, e consistiu em exposições do Professor Celso Ludwig, doutor em Direito pela Universidade Federal do Paraná, atualmente docente de Filosofia do Direito nessa instituição e de Filosofia Geral e Jurídica na Facinter. Além da formação em Direito, o professor Ludwig também é graduado em Filosofia (PUC-PR) e em Letras (UFPR). Segue uma resenha do evento com base na fala do professor, assim como nas fontes bibliográficas disponibilizadas aos participantes.

Durante o curso foram apresentadas as principais perspectivas da filosofia ocidental, que foram adequadas a uma classificação de períodos do pensamento filosófico a partir da noção de paradigma, originariamente formulada por Thomas Kuhn. As condições de construção do conhecimento foram analisadas em seus caracteres normativo, intelectivo e, ainda, em seus desdobramentos fáticos, levantando-se algumas críticas possíveis. A ênfase recaiu sobre o pensamento filosófico moderno, com especial atenção para o alerta de Enrique Dussel a um aspecto mítico negativo de institucionalização do etnocentrismo subjacente ao projeto da modernidade. Salientou-se, ainda, diagnóstico de Sérgio Rouanet sobre o desenvolvimento do pensamento Iluminista em suas principais aparições (Ilustração, Liberalismo e Socialismo). Pretendeu-se, enfim, apontar para a necessidade de reafirmação do projeto da modernidade no que ele guarda de libertador e de dignificante do ser humano, reafirmação formulada pela refutação de relativismos que impossibilitam a crítica e a superação de problemas sócio-culturais, com manifesta oposição às tendências suplantadoras da racionalidade que assolam o mundo contemporâneo.

O conceito de paradigma, inicialmente forjado para descrever os sucessivos processos de descontinuidade, crise e reformulação dos modelos de solução de problemas observáveis na história da ciência, é utilizado neste contexto para demonstrar os horizontes do saber ocidental nas várias formas que tomou desde seus primórdios na Antiga Grécia. A formulação das três tradicionais perspectivas da filosofia, a saber, cosmológica (da filosofia grega antiga), teocêntrica (Europa medieval) e antropocêntrica (do mundo ocidental moderno) - e uma quarta, ainda incipiente, denominada ecocêntrica - é assim transcrita quando cotejada com a noção de paradigma: ser (cosmológica), consciência (antropocêntrica) e linguagem (segunda metade do século XX). Essa abordagem dos horizontes de projeção do pensamento filosófico serviu para evidenciar o giro lingüístico na filosofia do século passado em, ao menos, três de suas aparições fundamentais. São elas: a Razão Comunicativa, de Karl-Otto Apel e de Jürgen Habermas; a Razão Sistêmica, de Niklas Luhmann, e a Razão Hermenêutica, de Hans-Georg Gadamer. A grande virada da linguagem foi a modificação dos pólos de fundamentação do pensamento, que na modernidade se centravam no sujeito e na consciência cartesianos (“Cogito ergo sum”), para a linguagem e o consenso. O conhecimento, que antes era apreendido pela mente humana (“res cogitans”), liberta da dúvida sistemática do método cartesiano por ser sua condição fundamental, passa a ser visto como consenso produzido através de um acordo argumentativo partilhado pelos interlocutores de um ato de comunicação (LUDWIG, 2006, p. 94).

A abordagem de Apel, denominada pragmática transcendental, recebeu atenção privilegiada porque se opõe a uma relativização ou negação do consenso pela multiplicidade de sentidos inerente às coisas (LUDWIG, 2006, p. 101). A vontade de argumentar e de produzir consenso através de critérios objetivos sempre prevalece, “pois quem recomenda o dissenso, argumenta; e quem argumenta busca o consenso sobre a argumentação em jogo” (idem, ibidem, p. 101).

À luz da crítica de Enrique Dussel ao projeto da modernidade são evidenciados dois conteúdos que atravessaram este simultaneamente. Um é o sentido primário de emancipação da humanidade através da razão invocado com o movimento do Iluminismo. O outro diz respeito aos desdobramentos práticos do mito que impregnou o pensamento europeu a partir do conteúdo primário da modernidade: a civilização moderna, que teria se tornado mais desenvolvida através da ascensão da racionalidade, teria o dever moral de civilizar os povos rotulados como primitivos.
A prática da violência naquele contexto seria, em última instância, legítima, por ter intenção de civilizar verdadeiramente o violentado (DUSSEL, 1992, p. 185-186). A “transmodernidade” insurge-se como meio para a superação dessa racionalidade unilateral e etnocêntrica porque situa a alteridade no centro de seu discurso. Assim, busca-se a realização do ideal da modernidade a partir do que ele tem de efetivamente emancipador (DUSSEL, 1992, p. 187). E isso só pode ser obtido com o reconhecimento e a subseqüente superação da modernidade em seu conteúdo mítico e negativo.

A análise de Rouanet (1993), em sentido contrário a de Dussel (1992), não se direciona especificamente aos excessos do projeto da modernidade, mas para o fato de este ser progressivamente negligenciado na contemporaneidade. Isso não obsta, todavia, uma análise minuciosa dos principais desdobramentos do que o autor denomina “Idéia Iluminista”, incidente nos últimos séculos. E o que ele pretende, a partir de uma síntese crítica dos movimentos da Ilustração, do Liberalismo e do Socialismo, é reconstruir o ideal racional iluminista nos dias de hoje, com a devida atenção a constatações que não podem ser refutadas pela História. A “Idéia Iluminista” deve ser, portanto, “instrumento de análise e padrão normativo” para a realidade (ROUANET, 1993, p. 43). Prima-se pelo universalismo do ser humano por meio da negação do etnocentrismo, porém sem se incorrer nos relativismos da antropologia cultural do século XX, que tornou o conceito de cultura inatingível a críticas. Se cada sociedade se constrói culturalmente de formas distintas, não seria possível escalonar padrões culturais. Assim, qualquer crítica a um determinado problema cultural seria sempre relativa, portanto, desautorizada ou descabida, porque partiria de uma perspectiva diferente da realidade observada. O universalismo a que Rouanet se refere tem por intenção última englobar todos os seres humanos, indistintamente, na assunção de sua individualidade, de sua liberdade e de sua capacidade de autonomia política, econômica e intelectual (ROUANET, 1993, p. 33).

A discussão delineada pelo professor Ludwig é de grande relevância para as temáticas abordadas nos trabalhos do grupo de pesquisa “Efetividade dos preceitos constitucionais sobre desenvolvimento sustentável e responsabilidade social ambiental: quo vadis, empresa brasileira?”. Afinal, o projeto da modernidade é considerado um fator de imensa e de contínua transformação da realidade, e as revoluções científica e tecnológica do século XX são alguns de seus inegáveis reflexos. Com as decorrentes transformações dos instrumentos de produção e dos modos de vida nas diferentes sociedades surgiram problemas sociais e ambientais sem precedentes históricos. O grupo de pesquisa, ao discutir o aspecto ambiental dos problemas que derivaram de um desenvolvimento econômico insensível aos impactos negativos de suas intervenções, e ao primar pela afirmação de preceitos constitucionais positivos favoráveis à concepção de desenvolvimento sustentável, redireciona a razão em favor do ser humano e de seu meio-ambiente, cujo exemplo pode ser o estudo, realizado em seminários do Grupo, da racionalidade ambiental proposta por Enrique Leff. Desse modo, o pensar racional reassume seu conteúdo crítico e é impedido de ser reduzido, conforme expressão de Theodor W. Adorno, à mera razão instrumental, ao saber técnico esvaziado de conteúdo crítico e puramente subserviente a fins estritamente econômicos (REALE, 1991, p. 844). Tal intento dirige-se, inevitavelmente, a impedir que o Iluminismo redunde em sua autodestruição.

Referências
Textos citados utilizados durante o curso
DUSSEL, Enrique. 1492: o encobrimento do outro. Petrópolis, Vozes, 1992.
LUDWIG, Celso. Para uma filosofia jurídica da libertação: paradigmas da filosofia, filosofia da libertação e direito alternativo. Florianópolis: Conceito, 2006.
ROUANET, Sérgio. Mal-estar na Modernidade. São Paulo: Companhia das Letras, 1993. (Cap 1.)

Demais fontes consultadas
ADORNO, Theodor; HORKHEIMER, Max. Dialética do esclarecimento. São Paulo: Cultrix, 2000.
DESCARTES, René. Discurso do método. Tradução de Enrico Corvisieri. São Paulo: Abril Cultural, 1999. Coleção: Os Pensadores.
REALE, Giovanni. História da filosofia: do romantismo até nossos dias. V. 3. São Paulo: Paulus, 1991.

Mais informações disponíveis em
Página do Centro Acadêmico Hugo Simas. Disponível em:
<http://www.cahs.org.br/site/index.htm>. Acesso em: 27 jun. 2008.

Blog do Grupo de Pesquisa. Disponível em:
<
http://quovadisempresabrasileira.blogspot.com>. Acesso em: 27 jun. 2008.

Como citar esta matéria
BESTER, Gisela Maria; SOUZA, Eduardo Emanoel Dall’Agnol; VENTURI, Eliseu Raphael. Integrante de grupo de Pesquisa do Mestrado do UNICURITIBA participa do curso "Os Grandes Paradigmas da Filosofia e questões da Modernidade, Pós-Modernidade e Transmodernidade" da UFPR. Disponível em: <
http://quovadisempresabrasileira.blogspot.com>. Acesso em: 22 set. 2008.